Os marranos têm uma história bizarra. Seus ancestrais, na Espanha do século XV foram adulados, exortados, ameaçados e obrigados a se converterem ao cristianismo. Eles o fizeram, em massa, conforme as exigências cristãs. Depois que 170 mil judeus foram expulsos em 1492, por não quererem se converter, cerca de 300 mil conversos permaneceram na Espanha. A maioria deles converteu-se ao cristianismo. Eles tornaram-se muito religiosos, fundadores de conventos, líderes da ordem dos jesuítas, e ocuparam outros cargos cristãos elevados e até reais.
A maioria dos marranos converteu-se ao cristianismo, principalmente porque foram obrigados a isto; mas também por causa da atração adicional de tirar de suas famílias o temor da perseguição e serem aceitos dentro da sociedade espanhola “normal”. Os marranos foram denominados “cristãos-novos”, e foram odiados simultaneamente pelos “velhos cristãos” e repelidos pelos autênticos judeus, que não cederam à pressão para se converterem. Os “velhos cristãos” iniciaram um movimento que investigava todo o mundo em busca da “pureza de sangue”, ou seja, se não estava manchado pelo sangue da conversão. Mas eles mantiveram sua individualidade e contribuíram mais do que qualquer outro grupo étnico para cultura da Renascença.
Muitos dos marranos, submeteram ao batismo, observavam os rituais cristãos apenas externamente. No íntimo de suas almas, eles continuaram observando os costumes judaicos. Curiosamente, a escolha das observâncias era quase aleatória e exclusiva de cada comunidade. Por exemplo, as velas de Shabat eram acesas no porão, de modo clandestino e seguro, enquanto outras cerimônias importantes foram descartadas, mesmo na privacidade. Por séculos, seus descendentes continuaram a praticar sub-repticiamente estes costumes e leis, como era o costume de sua família, embora eles não soubessem mais porque assim procediam.
Estas pessoas foram denominadas Anussim (forçados) em contraste com os Meshumadim, que eram apóstatas por vontade própria. A história judaica tem conhecido este tipo de judeu desde o século IV. Em Portugal, os Anussim perduraram até o século XVII. De fato, muitas crianças que sobreviveram ao Holocausto e foram batizadas pela igreja depois de serem salvas pela mesma são, em alguns sentidos, similares aos Anussim das épocas anteriores. Às vezes, os Anussim retornavam ao meio judaico como, por exemplo, aqueles que chegaram ao Recife em maio de 1630, depois que os holandeses desembarcaram no nordeste brasileiro. Eles foram circuncidados e plenamente convertidos, e tornaram-se judeus praticantes. Alguns marranos que se converteram ao cristianismo contra sua vontade em Portugal (depois de 1497, quando, segundo relatos, não havia absolutamente nenhum judeu vivendo em Portugal) escaparam e retornaram ao judaísmo, formando um Kahal Kadosh Shel Baalê Teshuvá, uma Comunidade Sagrada de Arrependidos, em Salônica.
Quase todos os descendentes de Marranos – que não abandonaram totalmente o judaísmo naquela ocasião – fizeram casamentos mistos nos quinhentos anos seguintes. Alguns marranos, que mantiveram sua associação com seus ancestrais, agora procuram entrar de novo no povo judeu. A pergunta é se estes cripto-judeus devem se submeter ao ritual inteiro da conversão, ou simplesmente serem considerados “judeus arrependidos”. Está bem claro que esta é uma questão que só pode ser decidida pelos padrões prescritos na Halachá, a lei judaica – não pelos sentimentos a respeito da óbvia sinceridade dos indivíduos, nem pela compaixão por seus ancestrais que foram Anussim, compelidos a se converterem, e nem mesmo pelo grau atual de sua observância de Mitsvót.
A Halachá determinará a lei a ser aplicada para determinar se os ancestrais maternos do marrano continuaram judeus em cada um de seus casamentos ou não. A menos que alguém que deseja ser um judeu pleno tenha uma árvore genealógica comprovável que volte até séculos atrás, o mais provável é que algum de seus descendentes, perseguido e disperso pelo mundo civilizado, tenha se casado com um não judeu.
Por este motivo, os marranos estão em uma posição qualitativamente diferente da dos Falashas, da Etiópia. As comunidades Falashas, em sua maioria, eram sociedades fechadas, cuja população nativa casava-se fielmente somente dentro de suas comunidades judaicas. Sua linhagem é impecavelmente judaica; eles não exigem rituais de conversão adicionais. Eles já são judeus. Mas aqueles Falashas que se misturaram com a comunidade maior durante gerações não podem ser considerados como tendo sempre se casado com judeus. Este é o mesmo caso dos judeus russos que emergem após duas ou três gerações de perseguição pelos comunistas ateus. As probabilidades de casamentos mistos na família, no passado, são tão grandes, que tornam implausível que eles sejam halachicamente judeus.
Eles não podem entrar para o povo judeu simplesmente porque afirmam seu desejo genuíno; é preciso uma autenticação positiva de sua linhagem ou uma conversão completa ao judaísmo.
Os filhos dos marranos que desejam observar os costumes judaicos como judeus plenos, por dentro e por fora, devem se recebidos de volta com boas-vindas ao povo judeu de todo o coração e com os braços abertos. Eles são corajosos e sábios, e devemos manter as portas sempre abertas à sua oa-vontade. Mas eles terão de seguir todo o protocolo de conversão, como descrito neste livro, para confirmar sua condição legal de judeus, e acabar para sempre com quaisquer dúvidas, quanto a eles e seus filhos, sobre se eles são judeus autênticos ou não. De fato, eles serão novamente os filhos de Abrahão e Sara.
A eles, eu digo: ‘Bem-vindos de volta. Esperamos por vocês com as luzes acesas”.
Apêndice exclusivo à edição em Português da obra:
Bem-Vindo ao Judaísmo - Retorno e Conversão
de Maurice Lamm
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